Para além do botox: toxina botulínica otimizando o tratamento da dor
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A toxina botulínica (TB) é uma substância produzida pelas bactérias Clostridium botulinum que tem sido utilizada na prática clínica desde a década de 90, inicialmente com fins estéticos [botox] e posteriormente com o objetivo de tratar espasticidade¹.
O principal mecanismo de ação da TB é bloquear a acetilcolina, um neurotransmissor que atua na passagem do impulso nervoso dos neurônios na junção neuromuscular, sem alterar a transmissão neuronal dos sinais elétricos e sem alterar a produção de acetilcolina, promovendo paralisia da musculatura desejada. Mais recentemente, observou-se que, além das propriedades citadas, a TB apresenta efeitos analgésicos, não apenas por contrapor a hiperatividade muscular, mas também por apresentar efeito analgésico e anti-inflamatório intrínseco, uma vez que a TB atua bloqueando a produção de substâncias específicas que estão relacionadas a geração e a perpetuação da dor.
A TB foi liberada no Brasil em 1997 pelo Ministério da Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária, porém só se popularizou posteriormente, quando passou a ser produzida nacionalmente. Desde então, a utilização da TB com fins terapêuticos tem sido observada em diferentes contextos, sendo os maiores destaques para o controle da dor na enxaqueca crônica e de outras síndromes dolorosas específicas, como: cefaleia tensional, neuralgia do trigêmeo, neuralgia pós-herpética, síndrome dolorosa complexa regional, bruxismo e síndrome dolorosa miofascial.
A enxaqueca crônica representa uma condição debilitante caracterizada pela presença de dor de cabeça unilateral, com ou sem aura e duração de 15 dias ou mais. O paciente geralmente cursa com náusea, vômito e/ou alterações visuais e auditivas. Acredita-se que a cronificação da dor esteja associada ao abuso de analgésicos utilizados para o controle da própria dor de cabeça.
É importante ressaltar que a enxaqueca crônica implica em grande comprometimento da qualidade de vida do paciente, promovendo alteração do humor, do apetite e do sono. A prática de exercícios geralmente agrava os sintomas. O tratamento da enxaqueca crônica é baseado no uso de antiinflamatórios, analgésicos comuns, triptanos e medicações de prevenção como topiramato e acido valproico. Nos casos refratários recomenda-se a aplicação de TB, a qual tem sido associada a resultados satisfatórios.
A cefaléia tensional diferencia-se da enxaqueca crônica, uma vez que é causada pela contratura da musculatura do pescoço decorrente de má postura, estresse ou ansiedade, sendo caracterizada pela sensação de aperto em toda a cabeça, de pequena a moderada intensidade, não comprometendo as atividades do dia a dia. O tratamento da cefaléia tensional envolve a necessidade de mudança do estilo de vida, a prática de atividades de relaxamento, o uso de analgésicos, fisioterapia e a aplicação de TB, ato que deve ser realizado por um profissional habilitado.
A neuralgia do trigêmeo, a neuralgia pós-herpética e a síndrome dolorosa complexa regional representam situações de dor neuropática, as quais devem ser tratadas inicialmente por medicações de primeira linha como os antidepressivos, os gabapentinoides e os anestésicos locais. Nos casos de dor persistentes recomenda-se o uso de fármacos opioides e quando estes não são efetivos, a adoção de medidas de terceira linha, como a utilização de cannabis medicinal e/ou a aplicação de toxina botulínica, medidas que tem se mostrado promissoras no controle da dor neste contexto.
Estudos demonstram que pacientes com bruxismo e com síndrome dolorosa miofascial, se beneficiam da aplicação de TB. Traumatismos únicos ou repetitivos, sobrecargas, inflamações e modificações do tônus muscular podem causar tensões musculares e intensa dor decorrente de contraturas musculares, as quais, quando persistentes representam indicação da aplicação de TB.
Existem vários protocolos que norteam a utilização da TB na prática clínica. Estes são de domínio das equipes treinadas para aplicá-los, entretanto devem ser compartilhados com os pacientes, para que desta forma possam ser alinhadas as expectativas e os cuidados a serem tomados com o início do tratamento. Sabe-se que, após a sua aplicação da TB, esta tem seu início de ação após cinco dias e duração do efeito de cerca de seis meses, sendo este mais intenso nos primeiros três a quatro meses.
Cabe ressaltar que o efeito da TB é temporário e que gradativamente o paciente vai retomando os seus sintomas, sendo indicada uma nova aplicação. Também é necessário um seguimento multiprofissional e uma mudança na qualidade de vida dos pacientes para otimizar os resultados obtidos.
Espasticidade¹: é um distúrbio frequente nas lesões congênitas ou adquiridas do sistema nervoso central (cérebro ou medula espinhal).
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.