Saúde e Bem-Estar

Redefinindo o controle da dor na anemia falciforme

Colunista On: Dra. Anita RochaAlgologista e especialista no tratamento da dor
Redefinindo o controle da dor na anemia falciforme

Foto: Camila Souza/GovBa

 


A anemia falciforme representa a doença hereditária hematológica mais frequente em todo o mundo, sendo considerada um problema crescente de saúde global, que afeta milhões de pessoas. No Brasil, estima-se que 0,1% a 0,3% da população negra seja afetada pela doença e acredita-se que pelo menos 2 milhões de pessoas carreguem o gene desta hemoglobinopatia. Mesmo sendo uma das condições genético hereditárias de grande prevalência, a doença falcêmica ainda é negligenciada. A enfermidade é caracterizada por uma alteração nas hemácias (glóbulos vermelhos que carregam oxigênio), que deixam de ser arredondados e assumem um formato de foice, daí o nome.


Trata-se de uma doença multissistêmica, que apresenta como um dos sintomas mais frequentes a dor. Esta é decorrente de crises vaso-oclusivas e/ou da sensibilização das vias responsáveis pela transmissão e percepção da dor. A dor geralmente é mista, apresentando componentes nociceptivos inflamatórios e neuropáticos, sendo muitas vezes tão intensa que implica na necessidade de internamentos frequentes, mas principalmente em grande comprometimento da qualidade de vida do paciente.  


Quando o paciente é exposto a infecção, desidratação, estresse emocional e/ou físico, as hemácias rompem-se com mais facilidade, provocando anemia e fortes crises de dores vaso-oclusivas, causadas pela obstrução de alguns pequenos vasos sanguíneos e pela consequente falta de oxigenação dos tecidos. Muitos pacientes evoluem com doença cerebrovascular (acidente vascular cerebral), lesão hepática, hipertensão pulmonar, priapismo (ereção persistente e dolorosa do pênis), retinopatia, ferimentos dolorosos abertos nas pernas (úlcera), hipoesplenismo, insuficiência renal e lesão óssea. A escolha deste assunto para a coluna desta semana se deu pela observação de que este tema é pouco discutido com a população geral e mais, de que muitos profissionais da área de saúde não se encontram preparados para diagnosticar e tratar de forma adequada a anemia falciforme. Isto é algo preocupante, pois sabe-se que os pacientes com anemia falciforme geralmente precisam de cuidados especiais ao longo da vida.  


Quando se pensa na anemia falciforme, a primeira preocupação é o diagnostico precoce, o qual pode ser feito ainda na maternidade, no momento da realização do “teste do pezinho”. Este sendo positivo deve implicar no encaminhamento do paciente para acompanhamento com a equipe de hematologia a qual irá fazer as orientações especificas: seguimento regular e educação quanto a patologia e sua evolução, uso de hidroxiuréia nos casos de episódios recorrentes de dor (promove o aumento da produção de hemoglobinas saudáveis, contribuindo para a redução de episódios de vaso-oclusão e de dor) e hemotransfusões quando necessárias. Uma opção de tratamento é o transplante de medula óssea o qual tem como fatores limitantes o custo elevado, os critérios rígidos de elegibilidade e a dificuldade de identificação de um doador compatível. Uma alternativa promissora é o uso de anticorpos monoclonais da imunoglobulina humana como o “crizanlizumabe”, o qual atua melhorando o fluxo vascular cronicamente e está associado a redução do número de crises por ano e ao aumento do intervalo entre as crises.


Em geral, o manejo da dor é complexo e envolve múltiplas intervenções, representadas por medidas preventivas, métodos farmacológicos e não farmacológicos. A escolha da terapia analgésica irá depender da gravidade, do local e do tipo de dor. Recomenda-se hidratação, reposição de vitamina D e uso de analgésicos conforme recomendação médica. Geralmente utiliza-se analgésicos comuns, antidepressivos, anticonvulsivantes gabapentinoides, fármacos opioides e magnésio. Dentre as medidas não farmacológicas destacam-se a acupuntura, massoterapia, técnicas de relaxamento e aromoterapia. 


Embora alguns pacientes necessitem de internamento, a maioria dos episódios de dor é tratada em domicílio. É fundamental que o paciente alinhe juntamente com a equipe de saúde um plano terapêutico individualizado e multiprofissional, uma vez que estudos demonstram que esta conduta está associada a menor necessidade de internamento, maior conforto e melhor qualidade de vida para o paciente. 

 


*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.


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Dra. Anita Rocha

Dra. Anita Rocha

Dra. Anita Rocha é médica Algologista , coordenadora do Itaigara Memorial Clínica da Dor, membro titular da Sociedade Brasileira de Anestesiologia; da Sociedade Brasileira de Dor e da Sociedade Brasileira de Médicos Intervencionistas da Dor. Possui residência médica em Anestesiologia pelo CET Obras Sociais Irmã Dulce; em Clínica da Dor pela UNESP-Botucatu e formação em Técnicas Intervencionistas para o tratamento da dor na Singular/Campinas. 

Instagram: @draanitarocha
 

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